domingo, 28 de dezembro de 2008

Vida de Árbitro

Hoje estou um pouco cansado
Tive jogo e muito tive que correr
Vou ficando estafado
Não sei se árbitro me irei manter

No distrito onde me cabe apitar
O melhor eu quero ser
Minhas pernas os chefes estão a cortar
Dizem que me querem proteger

Muito novo ainda sou
Mas os anos vão passando
Da arbitragem me estou fartando
Qualquer dia disso me vou

Com todos tenho boa relação
Mas invejas sobre mim existem
Ser como eu eles querem
Vocês nem tão a ver como eles são

Querem ser uns grandes abutres
Devoradores, forazes, cruéis
Não tenho medo de mamutes
Os árbitros não são fiéis

Porque é que somos assim?
Custo a perceber
Qualquer chi-cha-pim
Doutor ele quer ser

Que futuro me resta a arbitrar?
Dia 10 de Maio eu vou decidir
Mais uma vez não vão enganar-me
O meu orgulho não vai permitir

Alguns amigos vão permanecer
Outros guia de marcha vão levar
Alguns pretendo conservar
Outros talvez nunca mais ver

Ser árbitro não é uma facilidade
Ter que em momentos decidir
Provocar desgostos e felicidade
Ver inimigos surgir

Há um caminho íngreme a percorrer
Objectivos a atingir
Uns muito vão correr
A meio do caminho vão sair

Será que é mundo cabrão?
Por o mal dos outros se luta
Mas fica na recordação
A desgraça que aos outros se imputa

Mexe, remexe, e toca a mexer
Com as duas mãos se puder ser
Há-de ser o melhor quem eu me apetecer
Eu é que mando e assim vou fazer

Trocas e baldrocas há a registar
Assim Portugal vai continuar
Será que o mal é local?
Portugal é assim no geral!

Canções bonitas me tocam
Falam, falam, falam
Só à 1ª me enganam
Do pouco que fazem não me encantam

Porquê não havemos de mudar?
Porra do sistema a vigorar
Apito Dourado p’arquivar
Esta merda não há-de mudar

Assim vai a arbitragem
Com a peneira não hei-de o sol tapar
Isto sempre foi uma ladroagem
Padrinhos e padrinhagem a vigorar

Sempre assim há-de ser?
Nunca há-de mudar?
As pessoas tem que perceber
Não há vontade de que está a mandar

Leis e mais leis para estudar
Um advogado pareço
Mas de tempo para analisar
Disso eu não mereço

Em segundos há que decidir
Penalties para assinalar
Penalties por marcar
Vai acontecer já a seguir

Cartões foram feitos para mostrar
Não os convém dar
Eu cá não dou nenhum
Choviam pedidos, armava-se um zum-zum

Treinar, estudar e progredir
É o lema capital para seguir
Seguir vivendo na ilusão
Que o melhor é campeão

Há certas normas regulamentadas
Quem não cumpre leva com a ripa
Não convém dar más passadas
Pois no fim é feito numa tripa

Descidas e subidas
Em plenário são discutidas
“Sobe o meu e sobe o teu”
O sistema no apogeu!

Beja do interior é
Que maldade nos calhou
Sempre a levar pontapé
Raio de maldição, quem a lançou?

Alentejo, tá de passagem
Caminho entre algarve e capital
Nem no raio da arbitragem
Portugal deixa de ser Portugal

“Pelo justo paga o pecador”
Justiça é a palavra mestra
O Chefe decide sem grande alvor
Quem interessa e quem não presta

Quem caminho vamos levar
Desacreditação há-de continuar
Quem manda mete água
Que se fode fica com mágoa

Decidindo a torto e a direito
Intenções a manobrar
Tá tudo feito, tá tudo feito
Manda quem pode mandar

Tristezas vamos soltando
Verso a verso vão saindo
Recordações vão ficando
O sorriso lá vai saindo

Não me esqueço quem me traiu
Esses pouco valor têm
Palmadinhas nas costas e lá saiu
Aquilo que todos vêem

Não admito compadrios
Nem calculismos ou mentiras
Prefiro que sejam frios
Enterras-te quando juras

Qual é o melhor modo de analisar?
Isenção por força tem que existir
Imparcialidade coisa a rarear
Mentir e toca a banda a seguir

Não se olham a meios
Para atingir os fins
São uns feios
Não têm tins-tins

Quem não é recto que saia
Quem for marreco abandone
Arbitragem não é a vila faia
Não há banda nem trombone

Doutra coisa me apetece falar
O sono já está bater
Raio de sina, 1 terço da vida a hibernar
Quem me dera menos ter que ser

Aos 90 anos chegarei?
Que terei para contar?
Um velho chato eu serei.
Os meus bisnetos hão-de se orgulhar

Cara metade a encontrar
Tarefa nada simples de se fazer
És solteira? Vem-me conhecer
Quem sabe não nos podemos acertar

Amanhã há muito que fazer
É um lema com tradição
Nada quero comprometer
Na vida há que ser campeão

Umas quadras hoje eu fiz
Como poeta sou petiz
Não sabia este jeito ter
Inda há muito p’aprender

Descansado vou dormir
Amanhã outro dia pa enfrentar
Até o sol escurecer
Muitas emoções há pa sentir

Última quadra que hoje faço
Mais eu já não me maço
Ninguém vai ler
Sempre eu as vou ter!

Dinis Gorjão - 2005

Sem comentários: